19 de Março de 2024

Quando fazemos de nós a voz do outro!

Sexta-feira, 13 de Maio de 2022 - 06:29 | Redação

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Quando fazemos de nós a voz do outro!

Rosildo Barcellos *

Quando fazemos de nós a voz do outro!

Nunca fui uma pessoa de muitos amigos, mas sempre soube reconhecer o valor que as pessoas têm e tiveram ao longo da  vida. As que me tratam bem, lógico. Portanto, o amor, mesmo que silenciado em mim é o amor ao ser humano.

E por isso, de uns tempos pra cá tenho contado a vida das pessoas. Podem ser simples, podem ser personalidades; mas cada uma teve a sua dificuldade particular e se tornaram mais do que eram pra ser. E faço destas histórias o retrato do que há em torno de nós.

Neste artigo faço um breve passeio pela história de Lídia Baís, que será uma das homenageadas do Festival da América do Sul em Corumbá, na edição 2022, ao lado do poeta Lobivar. Sobre Lídia; muito mais que uma artista modernista, foi uma mulher moderna.

Viveu e experimentou a transição da sociedade e acompanhou as rápidas mudanças decorrentes da modernidade do século XX. Sua história de vida nos mostrou as contradições modernas e as angústias inerentes desse momento se refletiram em suas pinturas.

Lídia Baís representou o conflito do ser humano moderno, vivendo uma vida de paradoxos e contradições a partir de suas próprias experiências. E por este motivo é interessante pensar a produção escrita e artística feminina partindo da experiência de Lídia Baís, considerada precursora das artes plásticas no estado, no processo de escrita de si.

Além dos conhecimentos vindos da oralidade baseei-me no livro História de T. Lídia Baís (1960), que é autobiográfico, escrito em terceira pessoa com o pseudônimo de Maria Tereza Trindade. A partir da leitura dessa obra, procurei pensar os modos como as mulheres escrevem a si mesmas, como forma de preservação de suas memórias, mas sobretudo, como a escrita e a arte tornam-se instrumentos de resistência nos contextos femininos.

Nascida no dia 22 de abril de 1900, Lídia Baís foi uma pessoa que sempre esteve à frente do seu tempo. Apesar de ser muito católica, procurou conhecer e entender outras religiões, como os rosa-cruzes e a umbanda. E estes esses elementos místicos serviram de forte inspiração para suas pinturas.

Seus primeiros quadros foram pintados por volta do ano de 1915. Nos anos 20, convenceu o pai a deixá-la viajar para estudar pintura no Rio de Janeiro com os professores Osvaldo Teixeira e Henrique Bernardelli. Este último, foi o responsável pela abertura do curso de belas artes na capital fluminense.

É certo que seu pai, Bernardo Baís, almejava para  Lídia o mesmo destino que tiveram as outras duas filhas. Outrossim, em 1938, Lídia Baís enfim cedeu aos desejos do pai e aceitou se casar com o advogado paulista Arthur Vasconcelos.

Mas, com um detalhe: ela alterou seu ano de nascimento para 1910, quinze dias após a cerimônia, o casamento foi desfeito. Além de não haver consumação,  motivos como o alcoolismo do marido levaram à anulação do casamento.

Em 1950, funda o Museu Baís em Campo Grande, que não chega a ser aberto ao público. Ingressa na Ordem Terceira de São Francisco de Assis, adotando o nome de Irmã Trindade. Lídia faleceu em outubro de 1985, em razão de uma queda, que a deixou exaurida.

Muito antes disso, apresentava sinais de desânimo e desinteresse pela lida diária, e por isso isolou-se. Ademais, é importante resgatar a memória de Lídia Baís e isso foi feito, por exemplo, pelo escritor e artista plástico Fábio Quill, em seu livro “A Casa Baís”, onde relata a força e resistência da artista por meio de histórias em quadrinhos.

Quanto a casa que a artista morou, se tornou museu e viveu momentos de glória antes da pandemia. É uma obra de arte plena do engenheiro João Pandiá Calógeras, construída em 1913, e foi o primeiro sobrado de alvenaria da cidade, depois foi pensão Pimentel e teve um belo pomar. Pena que passou por dois incêndios e por um certo tempo abandono. Mesmo assim, aquelas paredes resistiram ao tempo, assim como sua história!

* Rosildo Barcellos é articulista

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